As premieres mundiais ou, em português, “estreias absolutas” anunciadas pelo Teatro Nacional de São Carlos nos seus primeiros 50 anos têm um padrão: nem sempre aconteceram.
A conclusão é de David Cranmer, que desvenda neste artigo (2001) a relatividade da expressão “estreia absoluta”. O investigador em Ciências Musicais da NOVA FCSH analisou as óperas anunciadas como premieres mundiais em cartaz nos primeiros 50 anos do Teatro Nacional de São Carlos (1793-1843), antes das primeiras produções de Verdi, e encontrou referências a trabalhos que nunca existiram e a “novas” produções atribuídas incorretamente a determinados compositores. Curiosamente, Cranmer não encontrou menções a números especialmente compostos para algumas produções, esses, sim, verdadeiras estreias absolutas.
O primeiro maestro de São Carlos, António Leal Moreira, é um dos compositores a quem foram atribuídas erradamente estas estreias. La serva riconoscente (1798) tem apenas uma ária original, Os voluntários do Tejo (1793) não tem música pelo que não é considerada uma ópera e Raollo (1793) parece nunca ter existido. Um trio da sua autoria, incluído na produção Il disertor francese (1796) de Giuseppe Gazzaniga, mas incorretamente mencionado no libretto (texto da ópera), levou a outro erro: a ópera acabaria por lhe ser falsamente atribuída em Turim, em 1800, e em Milão, no mesmo ano.
Marcos Portugal e António José do Rego são outros compositores que protagonizam situações semelhantes, desvenda David Cranmer. O investigador adianta que as inúmeras imprecisões dos librettos relativas à originalidade das produções acabam por colocar em causa a veracidade de muitos dados dessa época.