Como a arquitetura oprimiu os internados no Hospital dos Alienados de Rilhafoles

O Pavilhão de Segurança do Hospital de Rilhafoles foi construído para acolher os doentes considerados mais perigosos e a sua arquitetura e os traços circulares coagiam os internados a ter comportamentos mais comedidos, sob uma vigilância e segurança mais apertada.

O Pavilhão de Segurança do Hospital de Rilhafoles, na freguesia de Arroios, foi mandado construir para separar os doentes mais tranquilos dos mais perigosos ou instáveis vindos da Penitenciária de Lisboa. Estes representavam um risco de fuga e de instabilidade à segurança dos vigilantes, dos restantes doentes e da equipa técnica.

O Hospital de Rilhafoles, mais conhecido por Hospital Miguel Bombarda, aquando da sua inauguração na segunda metade do século XIX, recebeu os “alienados” que estavam distribuídos em quatro enfermarias do Hospital de São José. Quando o médico Miguel Bombarda, à época diretor geral do Hospital, decidiu fazer reformas no final do século XIX, mandou construir ao redor do edifício principal um imóvel de tipo panóptico a céu aberto, circular, que serviu para enclausurar os doentes considerados mais perigosos, como os epilépticos ou alcoólicos. Este Pavilhão de Segurança ficou conhecido como a “oitava enfermaria”.

O Pavilhão de Segurança do Hospital Rilhafoles “tratava-se, pois, de um cárcere especial dentro do hospital – ainda que o local tenha recebido outras tipologias de alienados para além dos alienados criminosos – e as funções deviam estar, à partida, bem definidas”, referem Iván Sánchez-Moreno, do projeto Grup d’Història de Nou Barris (Barcelona), e de Bruno Barreiros, investigador do Centro de Humanidades (CHAM) da NOVA FCSH, neste artigo (2020).

Este edifico em circunferência, projectado pelo arquiteto José Maria Nepomuceno, foi desenhado sem formas aguçadas, retilíneas ou angulares para não causar acidentes, de modo a facilitar “quer a segurança dos alienados furiosos, em eventuais surtos maníacos que sofressem, quer a segurança de terceiros, como outros doentes e pessoal ao serviço”. Para além disso, era mais fácil a limpeza no seu interior e a vigilância dos internados.

No panóptico existiam dois tipos de celas: duas dezenas de quartos individuais e seis celas que albergavam dois internados. Cada uma tinha uma pequena janela que permitia ver o exterior do centro do edifício e vice-versa. Os lugares comuns eram o refeitório, a sala de reunião e “uma área consagrada à toilette: Casa de Banhos, Retrete e Lavatório”. No centro do panóptico existia um quiosque que aquecia a estrutura e onde se fazia uma inspeção permanente aos doentes, estrutura que mais tarde foi demolida e substituída por uma fonte.

Este edifício cumpria os requisitos da visão de Jeremy Bentham, filósofo que no século XVII propôs a criação destes panópticos por forma a controlar os internados. Na sua visão, era preciso tornar estes edifícios num “laboratório de poder: poder máximo de observação daquele que dirige a instituição e que permite antecipar, regular e produzir comportamentos quer dos detidos, quer do pessoal ao serviço na instituição”.

O Pavilhão de Segurança do Hospital de Rilhafoles foi inaugurado em 1896 naquela que é considera a Colina da Saúde e até ao seu encerramento em 2000, recebeu milhares de doentes. Em 1848, o Hospital de Rilhafoles instalou-se no edifício da Congregação dos Padres da Missão de São Vicente de Paulo, depois de se extinguir no país, erguido na antiga Quinta de Rilhafoles. Foi primeiro cedido ao Colégio Militar, mas a sua localização tornou-se premente para a fixação desta unidade hospitalar.

O lugar ficou, também, conhecido, pelo balneário D. Maria II, onde se administravam terapêuticas aos alienados, como banhos de imersão, de vapor ou banhos russos, “estando o Balneário aberto ao público geral que manifestasse interesse por este tipo de procedimentos clínicos e de lazer”, apontam os investigadores. Hoje, todo este complexo está classificado como Conjunto de Interesse Público e é, também, um espaço museológico.

Fotografia: Pavilhão de Segurança, conhecido como a oitava enfermaria. Créditos: Património cultural.

Escrito por
Ana Sofia Paiva
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