A 13 de outubro de 1917, há precisamente um século, os jornais portugueses anunciavam a vinda dos Ballets Russes a Lisboa. Almada Negreiros ficou tão entusiasmado que, no dia seguinte, escreveu um manifesto sobre a companhia de bailado e um dia depois aludiu, noutro texto, à ação da guerra sem saber que vinha aí a Revolução de Outubro na Rússia.
A companhia de Bailado de Sergei Diaghilev (1879-1929) – chamada Ballets Russes – era para Almada Negreiros um dos maiores exemplos de arte moderna: a revolução que tinha provocado na dança, privilegiando o tratamento plástico e estético em detrimento da temática, colocara-a na vanguarda artística do século XX, descreve Maria João Castro, investigadora da NOVA FCSH, no artigo que integra a edição especial (2012) da revista do Instituto de História da Arte dedicada a Almada Negreiros.
É por isso com fervor que, a 13 de outubro de 1917, Almada recebe a notícia, dada em quase todos os jornais portugueses – d’ O Século ao República –, de que a companhia integrara Lisboa na sua digressão a realizar no final desse ano. Logo no dia seguinte, escreve “Os Bailados Russos em Lisboa”.
Este texto viria a ser publicado no primeiro e único número da revista Portugal Futurista. “Português, atenção!”, começa assim o texto. “Escuta: os bailados russos estão em Lisboa! Isto quer dizer: uma das mais belas etápes da civilização moderna está na nossa terra!”, continua.
Embora Almada Negreiros não tenha apelidado o texto de manifesto, Maria João Castro classifica-o como tal: é uma “declaração pública e exprime uma atitude e uma posição estético-cultural e política”, justifica. O texto incita os portugueses a irem ver os Ballets que surgem “como uma espécie de sonho finalmente acessível à Lisboa de 1917”, acrescenta. Mais tarde, Almada diria ao Diário de Lisboa que o próprio Diaghilev elogiara o seu texto e o classificara como o que de melhor se tinha escrito sobre os seus bailados.
O que o ex-líbris do modernismo português não imaginaria era que poucos dias depois estalaria a Revolução de Outubro na Rússia. Sem saber dela, Almada Negreiros publica na Ilustração Portuguesa, a 15 de outubro de 1917, um artigo intitulado “As Tempestadas de Guerra”, aludindo a futurismo de Marinetti, à entrada de Portugal na I Guerra Mundial e ao papel da guerra como “purga dos males da sociedade”.
Os Ballets Russes acabariam por se estrear no Coliseu dos Recreios em dezembro de 1917 e permanecer até 28 de março de 1918.
Imagem: “Carnaval” (bailado russo) de Almada Negreiros. Atlântida, Lisboa.