Construir uma cidade a Metro – Parte V

O metropolitano não parou nas onze estações iniciais. Em 1960, começou a (prolongada) segunda fase de alargamento da rede e importantes achados arqueológicos no Rossio ficaram a descoberto depois de subterrados durante séculos.

Ruínas do Hospital de Todos-os-Santos, da Capela do Amparo e outros vestígios da Lisboa antes do terramoto de 1775 foram algumas das evidências encontradas nas entranhas da capital, aquando das escavações das valas na Praça da Figueira, em 1960. A intervenção arqueológica, a cargo de Irisalva Moita, arqueóloga e durante muitos anos diretora dos Museus da Câmara Municipal de Lisboa (CML), fez descobrir ainda um cemitério romano próximo do Rossio e um cemitério cristão na Praça da Figueira, a sete metros de profundidade.

Como é que isso aconteceu? Nem um ano tinha passado desde a inauguração da primeira fase do metropolitano quando, a 30 de maio de 1960, começaram as obras de alargamento da rede no Rossio. Dos Restauradores até Alvalade, as futuras estações iriam marcar o seu lugar no Rossio, Socorro (hoje Martim Moniz), Intendente, Anjos, Praça do Chile, Areeiro e Avenida de Roma.

Para minimizar os incómodos aos lisboetas e escoar o trânsito, as construções contaram com a colaboração do Ministério do Exército. Ficou a seu cargo “através de engenheira militar, instalar pontões metálicos nas zonas mais afectadas pelas obras, com a duração prevista para um ano e destinadas à construção da estação central do Rossio – cujo grosso ficaria no subsolo da Praça da Figueira – e a ligação desta aos Restauradores”, escreve Maria Fernanda Rollo, investigadora no Instituto de História Contemporânea (IHC) da NOVA FCSH, no livro “Um metro e uma cidade” (ed. Metropolitano de Lisboa, E.P., 1999).

As construções na Praça da Figueira prosseguiram com rapidez. Em junho do mesmo ano, os operários já tinham aberto três valas que ligavam os Restauradores ao Rossio/Praça da Figueira e os passadiços superficiais já tinham sido retirados da mesma Praça. Mas esta rapidez depressa se inverteu: na intervenção de uma das valas foram encontrados “importantes vestígios arqueológicos – ossadas humanas, traços da muralha fernandina, peças de louça e uma parte do velho Hospital de Todos-os-Santos – soterrado pelo terramoto de 1755”, aponta a investigadora.

As obras ficaram suspensas durante um mês, até 26 de agosto de 1960. Os segredos do passado de Lisboa transformaram a Praça da Figueira num campo de trabalho. O Museu da Cidade, refere a investigadora, decidiu recolher os achados arqueológicos para um estudo mais rigoroso, pondo de lado a hipótese de os elementos ficarem em exposição na futura estação.

Com ruínas a descoberto depois de muitos séculos escondidas, os lisboetas tiveram a oportunidade de as visitar, no seu sítio original, antes de serem levadas para o Museu da Cidade. O calendário marcou o dia 17 de setembro, um “domingo soalheiro”, para a visita. A obra na estação da Praça da Figueira, depois deste atraso, retomou ainda em setembro de 1960.

Fotografia: Rádio e Televisão na intervenção arqueológica no Rossio, 1960. Créditos: CML

Escrito por
Ana Sofia Paiva
Ver todos os artigos
Escrito por Ana Sofia Paiva

O PROJETO

Lisboa vista pela ciência [Saiba +]

Ficha técnica e contactos

Na redes

+ Comunicaçao de Ciência na NOVA FCSH

Unidades de Investigação da NOVA FCSH

Clique aqui para aceder às 16 unidades de investigação da NOVA FCSH.