Em 1984 já podiam ver-se alguns b-boys a dançar em locais da baixa lisboeta. A cultura hip hop, potenciada pelo cinema, as novas estações de rádio e a televisão, atingiu o seu auge no país nos anos de 1990, servindo de inspiração até a campanhas políticas.
As primeiras coreografias do breakdance, uma das facetas da cultura hip hop, surgiram em 1984, na Rua Augusta, na Praça do Comércio e no Rossio. Contudo, seria apenas entre o final dos anos de 1980 e o início da década seguinte que esta cultura viria a assumir, em Lisboa e no país, contornos do que tem sido considerado um “movimento”, escreve José Alberto Simões no seu livro Entre a Rua e a Internet. Um estudo sobre o hip hop português (Imprensa de Ciências Sociais, 2010), resultante da sua tese de doutoramento (2009) em Sociologia da Cultura, na NOVA FCSH.
No início dos anos de 1990 começaram a surgir atividades organizadas com regularidade sobre a nova cultura, como as noites de hip hop em bares e discotecas da capital. Também o graffiti começa a adquirir visibilidade, analisa o sociólogo.
Em Abril de 1991, surge no 92.4 FM Lisboa a Rádio Energia, uma estação de música rock do grupo TSF. Dois anos depois, em 1993, é nessa rádio que surge o primeiro programa dedicado apenas ao rap, outra manifestação do hip hop: Novo Rap Jovem, apresentado por José Mariño. “Era um programa onde o pessoal mandava os números de telefone e´bora lá encontrar-nos’… o programa era aos sábados, das 10 à meia noite, o meu irmão ‘tava a ouvir a rádio lá em baixo e ouviu assim rap, chamou-me logo… Aquela hora do dia… ainda por cima era ao sábado, o pessoal quase nem saía ao sábado à noite. Aquilo era… religião!”, descreve aquele que é considerado o mentor do hip hop em Portugal.
Em 1994 inicia-se a comercialização de mixtapes, com a venda da cassete Underground Music Scene, da autoria do DJ Bomberjack, numa loja de roupas usadas e discos de vinil no Bairro Alto, em Lisboa (a ElDorado, na Rua do Norte, 25) ao mesmo tempo que a Valentim de Carvalho cria uma nova editora portuguesa, a NorteSul.
A televisão também teve o seu papel, com as notícias sobre o fenómeno vindo do outro lado do Atlântico e com concursos de breakdance. Às salas de cinema de Lisboa chegavam entretanto os primeiros filmes sobre hip hop realizados nos Estados Unidos, como os emblemáticos A Loucura do Ritmo (Beat Street, 1984) ou A Malta do Bairro (Boyz n the Hood, 1991), que serviram de inspiração aos primeiros praticantes.
No ano de 1996, assinala José Alberto Simões, o rap viria a ter alguma utilização política, através da realização de hinos das campanhas eleitorais de Jorge Sampaio e Cavaco Silva para as presidenciais. Nos anos seguintes a esta ampla exposição, o hip hop perde alguma visibilidade pública. Entre 1996 e 1998 as estruturas e práticas emergentes apresentam maior especificidade e começam a orientar-se para os circuitos underground.
A partir do século XXI, os tempos do hip hop nas praças e no comércio de rua, na Baixa, dariam lugar à criatividade posta a circular na Internet para ser partilhada por milhões.
Nota: artigo atualizado a 16-03-2017 com o nome e a fotografia da loja Eldorado.