Se Lisboa foi sempre uma cidade portuária movimentada devido à sua posição privilegiada sobre o oceano Atlântico, foi no século XV que se deu, a partir do seu porto, uma das maiores revoluções na navegação oceânica tendo em vista territórios além-mar.
“A arquitetura das caravelas constituía uma espécie de segredo de Estado”, afirma Rui Manuel Loureiro, investigador do CHAM – Centro de Humanidades da NOVA FCSH neste artigo (2016). Por isso mesmo, não há testemunhos textuais nem iconográficos sobre os processos de construção destas embarcações que foram protagonistas das mudanças revolucionárias na navegação oceânica europeia a partir do porto de Lisboa.
Na década de 1470, a chamada “volta da Guiné” estava já implementada. A tripulação, constituída por marinheiros e soldados, largava anualmente de Lisboa numa jornada de ida e volta que demorava em média seis meses.
Nesta altura, Lisboa era o centro de uma complexa rede de rotas marítimas, que incluíam portos do litoral africano, arquipélagos da Madeira, Açores, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, sublinha o investigador. Em 1488, Bartolomeu Dias atingia o Oceano Índico. Dez anos depois Vasco da Gama inaugurava a rota marítima direta entre Portugal e a costa ocidental da Índia com o objetivo de participar no comércio internacional de especiarias asiáticas e bens de luxo com destino à Europa.
O sucesso comercial dos primeiros empreendimentos dos portugueses pelo mar levou-os à China e ao Japão. Com o apoio de colaboradores locais aprenderam “os segredos da Ásia”, desde a mecânica das monções que controlavam os calendários de navegação à vela e as rotas marítimas mais seguras aos mais importantes centros de produção e distribuição de mercadorias exóticas.
A “carreira da Índia” – ligação direta entre Lisboa e Goa – foi a mais importante rota marítima controlada pelos portugueses durante o século XVI, afirma Rui Manuel Loureiro. As naus portuguesas conseguiam transportar cargas de mais de mil toneladas e levar a bordo quase um milhar de pessoas. Todos os anos partiam entre março e abril e regressavam em dezembro com bens e mercadorias valiosas, incluindo animais de grande porte, como o célebre elefante asiático trazido para Lisboa e enviado depois a Roma na embaixada de Tristão da Cunha à corte papal em 1514.
Por essas alturas, Lisboa tornava-se também uma cidade exótica com a chegada de gentes oriundas das mais remotas partes do oriente: prisioneiros turcos, embaixadores persas ou príncipes da casa real de Ormuz, antiga cidade da ilha de Ormuz, hoje pertencente ao Irão.
Imagem: Planisfério de Cantino (1502), a mais antiga carta náutica portuguesa conhecida (Biblioteca da Universidade de Modena).