500 anos da igreja do Loreto, o marco italiano em Lisboa

O que têm em comum um incêndio, um saque, um terramoto e uma procissão com mais de 800 mil pessoas? A Igreja de Nossa Senhora do Loreto, no largo do Chiado. São histórias e traços a conhecer através de documentos, alguns inéditos, do arquivo desta igreja.

Situada na parte exterior da antiga muralha fernandina que delimitava a cidade, junto às portas de Santa Catarina, a igreja do Loreto encerra parte da história da comunidade italiana em Portugal. O artigo (2007) de Nunziatella Alessandrini, investigadora do Centro de Humanidades (CHAM) da NOVA FCSH, identifica-a desde o século XVI até à primeira metade do século XVII.

Tudo começa com o desejo de mercadores italianos ricos – sobretudo oriundos de Génova, Florença, Cremona ou Veneza – em se reunir à volta de uma igreja própria, de constituir uma confraria que dependesse diretamente da Santa Sé de Roma e onde a devoção a Santo António fosse substituída pela devoção à Virgem do Loreto, refere a investigadora.

Tomada a decisão, os italianos decidem comprar um terreno na freguesia dos Mártires e oferecer uma capela a São João em Latrão (Itália). Em contrapartida, teriam a autorização para construírem uma igreja com proteção e privilégios derivados da sua agregação ao Capítulo Lateranense, pagando anualmente um foro.

A construção começa em 1518 e são formadas as  Confrarias de Nossa Senhora do Loreto, do Santo Sacramento e de Santa Catarina. Após quatro anos, em 1522, a igreja abre portas ao culto e transforma-se num lugar de encontro de ricos mercadores de cariz comercial, explica a investigadora no projeto de investigação sobre marcas de água no arquivo da igreja.

Em 1615, o Bispo de Fossombrone, colector Apostólico de Núncio em Portugal, realizou uma procissão em honra de dois santos italianos pouco conhecidos entre os portugueses. Segundo os documentos da época, participaram mais de 800 mil pessoas, vindas “até dos reinos vizinhos”. Tal marco tornou a igreja mais frequentada e aumentou, consideravelmente, a sua fama, revela a investigadora do CHAM.

Em 1679, os estatutos da igreja foram renovados e todos os italianos em Lisboa deviam inscrever-se, colocando o nome, apelido, proveniência e morada na cidade, para que em caso de necessidade a igreja pudesse oferecer os seus serviços.

Com algumas reviravoltas nas suas páginas, a Igreja do Loreto foi marcada por três momentos que ameaçaram a extinção de um precioso espólio, refere Nunziatella Alessandrini.

Logo em 1580, acontece a primeira perda de documentos referentes ao século XVI: o saque das casas dos italianos ricos, em Alcântara. Muitos dos mercadores tinham levado livros de contabilidade e documentos da igreja para o seu lar, o que constituiu o desaparecimento de factos históricos sobre a igreja do Loreto. O segundo momento foi o incêndio de 1651, onde arderam documentos originais, entre eles os compromissos da Confraria. O terceiro momento, o mais emblemático, agitou a igreja do Loreto mas não a vergou. O terramoto de 1755 provocou um incêndio mas não danificou o arquivo da igreja, mantendo-se intacto até aos dias de hoje.

A documentação do arquivo revela estas e outras histórias ao longo dos séculos, inventariado pela primeira vez em 1983, pelo padre Sergio Filippi.

Escrito por
Ana Sofia Paiva
Ver todos os artigos
Escrito por Ana Sofia Paiva

O PROJETO

Lisboa vista pela ciência [Saiba +]

Ficha técnica e contactos

Na redes

+ Comunicaçao de Ciência na NOVA FCSH

Unidades de Investigação da NOVA FCSH

Clique aqui para aceder às 16 unidades de investigação da NOVA FCSH.