As rotas das cerâmicas e faianças lisboetas

A cerâmica portuguesa, e a de Lisboa em particular, nunca foi oficialmente distribuída. Um pouco por todo o mundo, estas louças eram parte das baixelas de casas abastadas. Como? Graças aos barcos que partiam do porto de Lisboa para as rotas comercias.

A cerâmica, as faianças e a olaria produzidas em Lisboa eram exportadas para vários pontos do mundo e o seu custo não era para qualquer bolso. Descobertas destas louças em vários países evidenciam que – pela qualidade, brasão da família e requinte dos objetos – o seu escoamento era feito pelas elites e por portugueses  de famílias abastadas. Há indícios de que a exportação da cerâmica tenha começado no século XVI e continuado durante o século XVII.

Porém, o poder régio não criou uma rota específica para a sua distribuição: “Nunca nenhum barco levou o seu porão preenchido exclusivamente com cerâmica. Este era apenas um subproduto de comércios pré-estabelecidos”, aponta Tânia Manuel Casimiro, investigadora do Instituto de História Contemporânea (IHC) da NOVA FCSH, no capítulo do livro “Meios, Vias e Trajetos… Entrar e Sair de Lisboa” (ed. Câmara Municipal de Lisboa, 2018).

A cerâmica instalou-se no mundo: na América do sul, através da rota comercial do açúcar; na América do norte, nos barcos que faziam a rota do bacalhau; no Oriente, nas rotas das especiarias. Mas foi com a importante rota do sal e de outros produtos como o vinho e o azeite que a cerâmica lisboeta chegou ao norte da Europa, no auge da sua exportação, de 1640 a 1670. É este “o período cronológico de maior parte das peças datadas”.

Londres é a cidade que continua a ter o maior número de achados arqueológicos de cerâmica portuguesa e lisboeta, nomeadamente pratos de qualidade e de grandes proporções, reservados ao mercado externo. O norte de Espanha também é rico em descobertas destes objetos, principalmente pratos e taças “decorados a azul sobre branco com alguns apontamentos de manganês”, um comércio que a investigadora acredita ter estado estabelecido durante o século XVII e a primeira metade do século XVIII.

Já na França, no porto de La Rochelle, foi identificada cerâmica lisboeta e faiança submersa no sul do país. Para Tânia Manuel Casimiro, devido às relações de Portugal com a Flandres, “é compreensível que diversa cerâmica oriunda de Lisboa tenha efetivamente servido à mesa dos milhares de Portugueses que ali se tinham estabelecido, tendo vindo a ser reconhecida em diversas intervenções arqueológicas”.

Mas as descobertas destes objetos continuam a surpreender. A mais recente, aponta a investigadora, é o volume de cerâmica encontrada em Gotemburgo, na Suécia. Documentos encontrados nesta cidade indicam que a louça portuguesa competia com a holandesa e a alemã, e que se estabeleceu em 1650 a 1700.

Em Estocolmo, capital da Suécia, descobriram-se poucos objetos de cerâmica, mas, em contrapartida, foram encontradas centenas de faianças, louças de qualidade. Outros achados de cerâmica lisboeta, em particular, e da portuguesa, em geral, foram descobertos em cidades da Estónia, Polónia, Lituânia e Dinamarca.

Apesar de os registos da exportação de Lisboa para estes locais não terem resistido ao tempo, as anotações de Londres à época evidenciam as dezenas de barcos lisboetas que atracaram no porto, com cerâmica no convés: “Lisboa era efetivamente o maior centro produtor do país e o grande responsável pela exportação de louça para o Norte da Europa”, conclui Tânia Manuel Casimiro.

Fotografia:  Prato em faiança encontrado em Amesterdão (Museu de Amesterdão). Créditos: Tânia Manuel Casimiro

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Ana Sofia Paiva
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