Um “safari urbano” chamado Alfama

A renovação do centro histórico de Lisboa está a transformar os bairros e a atrair cada vez mais turistas. Alfama é um dos bairros que assistem a esta transformação sentida, principalmente, pelos residentes. Investigadores do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais (CICS.NOVA) da NOVA FCSH abrem o coração de Alfama.

Nesta Alfama do século XXI, os petiscos portugueses passaram a ser apelidados de “tapas”, como na vizinha Espanha, e o vinho regional foi substituído por gin tónico. Alfama tornou-se “uma espécie de safari urbano, um parque de diversões móvel, tematizado em torno do Fado”, afirmam Luís Vicente Baptista, Jordi Nofre e Maria do Rosário Jorge do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais (CICS.NOVA) da NOVA FCSH, no artigo de revista publicado em 2018.

As deambulações de Jordi Nofre em Alfama, nomeadamente na Rua dos Remédios e na Rua do Vigário, entre 2015 e 2018, permitiram-lhe identificar novas facetas deste bairro. O consumo de Lisboa como uma “cidade vintage”, uma cidade do passado, fez com que o Fado adquirisse uma expressão mais importante e higienizada a nível turístico, numa espécie de Fadoscape, como definem os investigadores.

Alfama começa a ser partilhada com os turistas, numa ótica de mercantilização e comercialização crescente no bairro. Nas visitas dos turistas às ruas do bairro, as fotografias para as redes sociais são cada vez mais importantes, apontam os investigadores. Ir a Alfama sem tirar uma fotografia é semelhante a não ter percorrido as ruas do bairro.

Alfama “é massivamente fotografada e inclusive ‘instagramada’ (sem esquecer a imagem com filtro de cor sépia)”, afirmam os autores, e a fotografia “perfeita” aparenta ser aquela que retrata o passado e o presente no mesmo enquadramento. Os residentes octogenários parecem ser os modelos da objetiva, com o foco de conseguir imprimir naquela fotografia o passado de labor, de miséria e de degradação urbana.

Na Rua do Vigário, a D. Fernanda é uma das residentes do bairro e proprietária de um café. Explicou a Jordi Nofre que o bairro se transformou significativamente em menos de uma década do que nos 45 anos que ali reside. E desabafa ao investigador: “Daqui a alguns anos, Alfama será como um grande hotel, os vizinhos de toda a vida vão morrendo e as casas vão ser para apartamentos turísticos”.

Alfama está viva e mais turística. Com a aposta na renovação do bairro, o número de alojamentos turísticos tem aumentado. Se antes existiam apenas dois hostels em Alfama, em maio de 2018 os investigadores registaram mil 359 apartamentos turísticos disponíveis na plataforma Airbnb. As habitações temporárias são, também, fomentadas com os estudantes de Erasmus, que vão habitando no bairro desde 2010. Se a D. Fernanda é da opinião de que Alfama é semelhante a um “grande hotel”, os investigadores acrescentam que é um grande “hotel exterior”, localizado na cidade de Lisboa.

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Ana Sofia Paiva
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